Pai de Santo premiado nos EUA contra intolerância
Pai de Santo premiado, babalaô, sacerdote ou dirigente.
Enfim, há muitas maneiras de nomear.
Porém, o fato está consumado: Ivanir dos Santos acaba de receber do Departamento de Estado do Governo dos Estados Unidos um prêmio pela sua importância na luta contra a intolerância a praticantes de religiões de matriz africana no Brasil.
O babalaô – que também é doutor em História da UFRJ – mostra que tem os pés no chão.
“Quero pontuar que o prêmio é o reconhecimento de todas as nossas ações em prol das liberdades, dos direitos humanos, da pluralidade, das diversidades, contra o racismo e a intolerância”, destacou.
Da mesma forma, outros cinco líderes religiosos também foram homenageados:
Mohamed Yosaif Abdalrahan, do Sudão; Iman Abubakar Abdullahi, da Nigéria; Pascale e William Warda, do Iraque; e Salpy Eskidjian Weiderud, do Chipre.
De acordo com a premiação, todos contribuem com a as discussões relativas à liberdade religiosa em seus respectivos países. Vale destacar que a cerimônia contou com a presença do secretário de Estado dos EUA, Mike Pompeo (foto principal).
“Como bem sabemos, o racismo e a intolerância religiosa são os maiores desafios para construção de uma sociedade mais justa e igualitária.
Assim, no Brasil não é diferente, pois a intolerância religiosa vem crescendo cada vez mais no nosso país, e principalmente no Estado do Rio de Janeiro.
Precisamos acreditar que é possível construir uma sociedade mais tolerante onde nossas diferenças possam ser nossos pontos de encontros e nunca de exclusão”, destacou Ivanir.
Em 2008 Ivanir fundou a Comissão de Combate à Intolerância Religiosa, com integrantes de diferentes religiões, membros da sociedade civil e do Ministério Público. A comissão documenta os casos de violência religiosa e presta apoio às vítimas.
Ainda naquele ano, liderou a primeira caminhada em defesa da liberdade religiosa, no Rio de Janeiro. A última edição aconteceu no último dia 14 de julho, em Nova Iguaçu.
Durante o evento, ele reclamou da demora do governador Wilson Witzel para receber integrantes da comissão. Ressaltou também a importância do apoio do poder público no combate à intolerância.
“Eu não tenho dúvida de que se fosse uma sinagoga ou uma igreja cristã, a atitude do estado seria outra”, afirmou.
Ministra Damares Alves estava lá
Ao mesmo tempo, em viagem aos Estados Unidos, a ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, Damares Alves também compareceu à entrega do prêmio. Antes, disse que “já foi para a porta de Terreiro proteger o espaço”. E completou:
“Estamos em 2019. Não dá mais para aceitar a perseguição de uma pessoa por causa de sua crença. É como se estivéssemos 500 mil anos atrasados.”
Aliás, a ministra, que é evangélica, se mostrou ainda mais solidária:
“Eu já fui para porta de Terreiros proteger o espaço. Do mesmo jeito que eu não quero o meu templo violado, eu não quero que o deles sejam.”
Por outro lado, ao GLOBO, o babalaô Ivanir dos Santos afirmou que é preciso avançar no diálogo ecumênico no Brasil.
“Isto está sendo dito agora por ocasião de um prêmio nos Estados Unidos.
Pois a fala da ministra é um efeito do prêmio, que está sendo entregue a uma pessoa negra, não cristã, que tem trajetória na luta pelos direitos humanos, contra o racismo e a intolerância religiosa”, afirmou o laureado.
Umbanda: um dos alvos da intolerância
A fim de situar o contexto, Ivanir dos Santos lembra que as estatísticas do próprio governo, via Disque 100, mostram que o segmento mais atingido pela intolerância religiosa no Brasil hoje é a Umbanda — dos 506 casos registrados em 2018, 72 eram referentes ao segmento.
“Não se pode ignorar o que acontece. Uma das ações que a ministra, que é pastora, poderia fazer é reunir os neopentecostais e conclamá-los para que tenham uma agenda mais positiva.”
Eis aí uma boa ideia para a ministra pastora.
Pai de Santo premiado é o início
Nascido e criado na Mangueira, Ivanir teve a mãe, empregada doméstica, assassinada quando ainda era criança. Foi interno da Funabem (Fundação do Bem-Estar do Menor) e leciona, desde 2015, na UFRJ, onde concluiu doutorado em História.
Por fim, mais do que o Pai de Santo premiado, o importante é o reconhecimento. Que outros venham!