Religiões afro-brasileiras relatam preconceito em sala de aula

Religiões afro-brasileiras continuam sendo alvo de discriminação.

Kayque Ferraz, 8 anos, todos os dias era obrigado a rezar o Pai Nosso em sua escola (na foto com sua mãe Grazielle).

Adepto do Candomblé, se recusava a cumprir a ordem: dizia que era filho de Xangô e, portanto, permaneceria em silêncio.

A professora e os colegas insistiam.

E isso gerava isolamento ao menino.

Grazielle, a mãe, percebeu o comportamento estranho e foi conversar com a diretora.

Pediu para que a fé da criança fosse respeitada, mas nada mudou.

“Os professores e a diretora diziam que ele devia rezar porque era a regra da escola. A situação era ainda pior quando passávamos em frente a outro colégio, onde os alunos o chamavam de macumbeiro e o mandavam ir para a igreja. No início do ano, mudamos de casa, de Duque de Caxias para a Pavuna (na Zona Norte do Rio), e no novo colégio ele tem aulas sobre cultura africana e nossa crença é respeitada”, relata a mãe.

Kayque é apenas um exemplo da visão intolerante de diversas instituições de ensino.

O combate a casos contra as religiões afro-brasileiras ainda caminha a passos lentos.

VERSÃO OFICIAL – Em 2014, a Conferência Nacional de Educação (Conae) — encontro organizado pelo governo federal — orientou o Conselho Nacional de Educação (CNE) a elaborar um documento que limitasse as manifestações religiosas em instituições educacionais.

A iniciativa, com a finalidade de assegurar uma escola laica e proteger alunos de episódios de intolerância, ainda não foi elaborada.

Segundo a Lei de Diretrizes e Bases da Educação, o ensino religioso:

“…é parte integrante da formação básica do cidadão e constitui disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental”.

A matrícula, porém, é facultativa.

A lei estabelece ainda que é proibida a doutrinação dos alunos para alguma religião.

O ensino de história, cultura religiões afro-brasileiras foi instituído em 2003 como obrigatório nas escolas de ensinos fundamental e médio do país.

Mas, quase 15 anos depois, praticamente não há informação sobre sua capilaridade no sistema brasileiro.

Ela ainda depende da iniciativa de professores ou de pessoas comprometidas com o enfrentamento à intolerância.

Ainda não se entende a lei como algo central no debate educacional do Brasil.

Segunda a antropóloga e integrante do Núcleo Fluminense de Estudos e Pesquisas da UFF, Roseane Rodrigues nós temos um dos racismos mais perversos do mundo.

“Meus alunos negros não se veem como negros. A discriminação religiosa é o sinal mais evidente, porque existe uma negação na tentativa de compreender a mitologia africana, considerada inferior e sem prestígio em relação à cultura ocidental. Por que falamos da deusa da fertilidade grega, mas evitamos um debate sobre Oxum?”, questiona.

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O Globo/Custódio Coimbra
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