Música na Umbanda tem papel central na incorporação
Música na Umbanda é fundamental.
Aliás, você percebe isso logo na primeira vez que participa de uma Gira.
Certamente o som dos atabaques e os movimentos da dança é que colaboram para a “chegada dos santos”, as entidades de Umbanda.
Na maioria dos Terreiros, a música na Umbanda antecede os ritos de incorporação dos médiuns.
“A música e a dança são fundamentais nesse processo, pois facilitam a entrega do médium ao rito”, explica o pesquisador Gregório José Pereira de Queiroz.
De formação multidisciplinar, o musicoterapeuta e arquiteto decidiu investigar o ritual da incorporação na Umbanda e o papel da música neste processo a partir de sua própria experiência.
“Há uns dez anos me iniciei na Umbanda e sou um praticante”, relata Queiroz.
Além disso, foi numa Roda de Capoeira que a relação música/movimentos chamou a atenção do pesquisador.
Após a apresentação de um trabalho sobre esta relação, enquanto musicoterapeuta, Queiroz então decidiu estudar como os Pontos.
Os Pontos são cantos específicos que antecedem a chegada do santo ou da entidade, que influenciam na incorporação.
“Na Umbanda, um médium pode incorporar um ‘santo’, ou Orixá, que é uma divindade africana, ou uma ‘Entidade’, que é um ente que já viveu em nosso plano”, descreve.
Então, o arquiteto formado pela Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAU) da USP, decidiu empreender seu estudo sobre o tema.
Desta vez, no Instituto de Psicologia (IP).
Lá, ele desenvolveu a pesquisa Uma visão psicossocial do papel da música na Umbanda e na reorganização das identidades, apresentada em 2017.
E o trabalho gerou o livro O papel da música na umbanda e na reorganização das identidades, lançado em 2017.
O pesquisador percebeu semelhanças entre alguns processos musicoterápicos e o culto umbandista.
“A música e a expressão corporal têm muito a ver com o culto umbandista.
Há, entre as duas atividades, uma semelhança na forma, mas não nos objetivos”, observa.
No início, o pesquisador chegou a entrevistar algumas pessoas no intuito de obter informações sobre o processo de incorporação na Umbanda e a influência da música.
“Obtive respostas convencionais e que nada acrescentaram.
Foi aí que decidi fazer um estudo autoetnográfico, trazendo ao estudo a minha própria experiência”, conta.
De acordo com Queiroz, o ser humano possui diversas identidades.
E ele as vive de acordo com suas reações às pressões do meio e às necessidades.
“Há uma certa transição entre as identidades.
Quando conversamos com o gerente do banco, por exemplo, não o fazemos da mesma forma com que dialogamos com amigos do futebol!”, diz.
Segundo ele, passamos automaticamente de “uma identidade a outra”.
Uma das principais conclusões de Queiroz em sua pesquisa é que a música, somada ao movimento corporal e ao contexto social, acabam por favorecer a alteração de identidade.
“A música na Umbanda ajuda ao que denomino ‘deslizamento’ entre as identidades.
Em parte, se constrói uma nova identidade”, revela.
Assim, Queiroz faz tal afirmação por sua atividade de uma década na Umbanda.
“Semanalmente, no Terreiro que frequento, as entidades que incorporo prestam atendimento espiritual e aconselham consulentes”, conta.
O pesquisador explica que hoje, no culto umbandista, boa parte dos médiuns fica consciente durante o processo de incorporação.
“Quando minhas entidades recomendam ações e dão aconselhamentos eu vejo tudo o que ocorre, mas é como se uma outra identidade assumisse o controle”, descreve.
Contato do pesquisador: [email protected]
Foto de Gregório Queiroz: Marcos Santos/USP Imagens
Foto principal: Festival de Curimba Um Grito de Liberdade/Varal Cultural