Desenvolvimento mediúnico sob uma ótica ampla

Desenvolvimento mediúnico é tema de interesse para muitos umbandistas.

Não podemos negar que a doutrina espírita fundada por Allan Kardec possui praticamente dois séculos a mais de estudos da mediunidade do que a nossa própria Umbanda.

Ainda assim, graças ao brilhantismo das obras de Rubens Saraceni, a Umbanda começou a receber muitos títulos desvinculados dos ensinamentos individuais nos Terreiros e que ofertavam mistérios desvendados por meio de psicografias e intuições.

Com o nascimento da Umbanda Sagrada, pudemos ter contato com a Umbanda através de óticas que fortalecem nosso papel de ser humano no processo mediúnico.

Além disso, a religião nos desafia continuamente a buscar nossos questionamentos íntimos sem que tenhamos que abrir mão da nossa fé nos Guias espirituais, sem deixar de crer nos Orixás e em Deus (ou Olorum como chamamos).

Segundo Aurélio Buarque de Holanda Ferreira, no seu Pequeno Dicionário Brasileiro da Língua Portuguesa, desenvolver significa: tirar invólucro, expor minuciosamente, progredir, alargar, instruir-se. Portanto, desenvolvimento é o ato ou efeito de desenvolver. Sob uma ótica espírita, desenvolvimento mediúnico é o ato de fazer crescer. É o ato de progredir, expor a faculdade que permite aos homens se comunicarem com os Espíritos.

O desenvolvimento da mediunidade é o aperfeiçoamento de uma faculdade inerente a todos os seres humanos.

Insistimos no conceito de que todos são médiuns para poder desmistificar algo natural e, de certo aspecto, fisiológico a organização do corpo físico e espiritual.

Se nós falarmos somente em desenvolvimento mediúnico e não em “criar” mediunidade ou médiuns é, certamente porque esta faculdade não se cria numa determinada pessoa que não a possua.

A mediunidade é uma faculdade tão natural no homem quanto qualquer outro dos cinco sentidos habituais (visão, audição, olfato, tato e paladar).

Tomemos o paladar para exemplo: ninguém inventa faculdade inata, pronta para ser utilizada, como que programada por milênios e milênios de existências anteriores, documentada na nossa memória espiritual. É preciso, em cada existência que se reinicia, reaprender a utilizá-la adequadamente.

E isso seja para selecionar alimentos, definir preferências ou recusar substâncias prejudiciais. Assim também é a mediunidade um atributo físico do homem.

Entretanto, há no processo de desenvolvimento mediúnico o entendimento dos fenômenos mediúnicos. E é necessária a depuração de questões morais.

Em relação aos fenômenos mediúnicos, o que ocorre é um avanço de suas faculdades, o que o espiritismo entende como mediunidade ostensiva. A responsabilidade dessa faculdade exige do encarnado muito estudo e instrução. E isso nos gera muitas dúvidas.

Aliás, gera até discordância quando, já em 2019 com a Umbanda completando 111 anos, ainda nos deparamos com “representantes” defendendo a ignorância como o único caminho adequado para o “bom desenvolvimento”.

É fundamental conhecer e compreender as situações que são vivenciadas conforme o desenvolvimento de nossa mediunidade.

No que tange à Umbanda, poucas são as vertentes que acatam alguma literatura adequada sobre esses processos. As obras básicas de Rubens Saraceni, Alexandre Cumino, Rodrigo Queiroz são um excelente início de estudo.

E isso principalmente para aqueles que estão querendo aperfeiçoar seus dons mediúnicos. Além dos livros, alguns templos umbandistas responsáveis oferecem cursos de doutrina e teologia.

Estes, auxiliam os médiuns a conduzir, da maneira mais segura e responsável, a faculdade mediúnica, assim como cursos de desenvolvimento para aumentar a vivência da mediunidade, assistida por uma equipe espiritual dos templos e seus sacerdotes/zeladores.

Talvez a questão mais importante na qual o médium deve se ater é sobre o seu desenvolvimento moral. O orgulho, egocentrismo e o egoísmo podem atrapalhar o desenvolvimento mediúnico. Isso talvez explique a ainda maciça existência de templos que hesitam em aprender, ensinar e desenvolver seus seguidores.

Isso porque a fé cega e o médium dependente podem ser grandes alimentos para o ego dos dirigentes.

Os médiuns devem compreender que a atividade da faculdade mediúnica durante uma encarnação, mais do que ensinar algo, é servir a espiritualidade superior como intermédio à humanidade.

As palavras e ações do “filho” passam a servirem o bem propagando os ensinamentos dos Guias, a caridade pura umbandista. Os espíritos esperam utilizar de suas faculdades de tal modo a levar consolo e ensinamento aos irmãos encarnados.

Portanto, o desenvolvimento da mediunidade deve ter boas intenções a fim de servirem os bons espíritos pela missão de divulgar o bem. Outras intenções, como o benefício próprio e a vaidade são contrárias às leis e à justiça Divinas.

Bons médiuns são aqueles que guardam dentro de si a humildade e a intenção de auxiliar o progresso dos irmãos e do planeta Terra (ampliar e manter as criações divinas).

A mediunidade deve ser o instrumento utilizado pelos bons espíritos para auxiliarem a evolução espiritual e encaminhar nosso mundo à regeneração.

Etapas do Desenvolvimento Mediúnico

A mediunidade não requisitará desenvolvimento indiscriminado. Antes de tudo, demandará o aprimoramento da personalidade mediúnica e nobreza de fins. E isso servirá para que o médium possa tornar-se um filtro leal das Esferas Superiores com vistas à ascensão da Humanidade para o Progresso.

Mas então, como proceder ao desenvolvimento mediúnico?

Dentre muitos estudos “Kardecistas” encontramos as semelhanças de objetivos que são inerentes não a uma ou outra doutrina espírita, mas sim à necessidade humana de desenvolvimento, como podemos observar:

a) Etapa Intelectual:

É representada pela necessidade do estudo.
“…O estudo preliminar da teoria é indispensável, se quisermos evitar inconvenientes inseparáveis da inexperiência.” [LM-it 211]

Mesmo utilizando as palavras do espiritismos Kardecista, acima, concluo:

Nós, da Umbanda, também consideramos que o estudo da teologia umbandista e das nossas faculdades mediúnicas e também da Doutrina que seguimos são bases essenciais e indispensáveis.

b) Etapa Material:

É uma forma de treinamento da faculdade mediúnica, uma familiarização com as técnicas envolvidas no processo da mediunidade, que no nosso caso se dá quase em totalidade das vezes, através da incorporação.

Essa experimentação deve ser: perseverante, assídua, séria, em grupo, local adequado, sob orientação experiente, desprovida de condicionamentos.

Dessa forma, o candidato a médium deve ter persistência, exercitando-se para as comunicações em dias e horários certos da semana, pré-estabelecidos, de preferência em grupo.

Assim como Kardec preconizou em sua doutrina, a Umbanda também utiliza de reunião de pessoas com intenções semelhantes formando um todo coletivo onde a força e a sensibilidade se encontram aumentadas por uma espécie de influência magnética que ajuda o desenvolvimento da faculdade.

Essa influência em nosso meio é que objetivamos com nossas Giras e com os rituais de abertura e também com os Pontos Cantados e com a união de nossa egrégora, dentro e fora dos templos.

A reunião deste grupo em desenvolvimento deve ser sob a direção de pessoas experientes, conhecedoras da Teologia e Doutrina Umbandistas e do fenômeno mediúnico sobretudo. Esta reunião deve ser feita de preferência em local apropriado, isto é, no Templo umbandista, onde estaremos sob o amparo e a orientação de Guias espirituais, que são responsáveis pelos trabalhos mediúnicos da Casa.

Além disso, todo Templo tem suas firmezas e assentamentos que asseguram nossa proteção espiritual durante a abertura de nosso mental e a conexão com os espíritos.

É simples compreendermos, pois na Terra acontece o mesmo.

Um acadêmico de medicina inicia seu treinamento aos doentes num Hospital e sob a supervisão de um médico experiente para evitar desastres. Se for uma cirurgia será necessário um cuidado ainda maior em um local mais apropriado – um centro cirúrgico.

Então o candidato a médium não deve desistir se, após 2, 3 ou 10 tentativas de comunicação com os Guias não obtiver qualquer resultado ou qualquer indício mais real.

Como sabemos, existem obstáculos de correntes da própria organização mediúnica em desabrochamento. Há impedimentos materiais e psíquicos que, só com o tempo e a dedicação serão contornados.

Quanto ao médium que já controla bem sua faculdade, já possui consagrações, firmezas e assentamentos. E isso permite se comunicar com ampla facilidade, que seja, em uma palavra, um “médium feito”, seria um erro de sua parte, crer-se dispensado de qualquer outra instrução, pois o estudo é e deve ser uma prioridade durante toda a vida mediúnica.

E é a partir dessa evolução de conhecimento que chega à tona a necessidade mais vital do desenvolvimento mediúnico: o controle do ego!

Queremos, mesmo que sabendo ser contrário à uma doutrina mais organizada, trazer alguns mitos ou dogmas oportunos ora já superados pelas revelações publicadas para massagear nossa vaidade, com comportamentos dogmáticos e até procedimentos místicos sem base teológica. E tudo isso para engrandecer a visão externa sobre o “médium em questão”.

Mas esse médium feito venceu senão uma resistência material, e é agora que começa para ele o verdadeiro desafio, pois as verdadeiras dificuldades são: vencer a terceira etapa, a moral.

c) Etapa Moral:

O verdadeiro médium é aquele que não se contenta apenas em admirar a moral espírita, mas a pratica e aceita todas as suas consequências.

Convencido de que a existência terrena é uma prova passageira, aproveita todos os instantes para avançar no caminho do progresso, esforçando-se em fazer o bem e anular seus maus pensamentos. A caridade em todas as coisas é a regra de sua conduta.

Sob o ponto de vista espírita, a mediunidade é uma iniciação religiosa das mais sérias. É um mandato que nos é oferecido pela Espiritualidade Superior (os orixás) a fim de ser fielmente desempenhada.

Desta forma, o filho de santo (como chamamos os médiuns na Umbanda) deve partir da conscientização de seus ensinamentos. Deve esforçar- se, desde o início de seu aprendizado, por ser um médium religioso. Isto significa trabalhar incessantemente por nossa reforma moral.

Somente nossa evolução moral, nossa melhora e nosso crescimento para o Bem poderão garantir-nos o assessoramento dos Guias espirituais e poderão garantir o exercício seguro da mediunidade, por nossa sintonia com o Bem. E esta não é uma tarefa fácil, visto que o que mais temos dentro de nós são sensações e experiências negativas e deformadas trazidas do passado.

Por isso para nós ainda é mais fácil e cômodo, sintonizar com as atitudes negativas do que com as positivas.

E como faremos? Como nos livrarmos de condicionamentos inferiores?

Carregamos séculos de erros e alguns anos de boas intenções. É claro que não podemos mudar sem esforço. Temos que trabalhar duro nesta reforma moral (ou reforma íntima como queira). E isso só nós saberemos identificar e sentir porque estará marcada em nosso íntimo.

Trabalhemos com exercícios diários e constantes no bem, meditando e nos conectando muito com nossos guias e com os Orixás. A diferença de um bom médium e um médium desajustado, não está na mediunidade, mas no caráter de um e de outro; na formação moral está a base de todo desenvolvimento mediúnico.

Alguns cuidados devem ser tomados por todos aqueles que aspiram ao desenvolvimento mediúnico:

  • Trazer ensinamentos espirituais do bem para sua casa: isso proporciona a renovação do clima espiritual do lar, porque o lar é a usina maior de energia de que somos carentes, é onde compensamos nossa vibrações psíquicas em reajustamento.
  • Recomendo a leitura de “Rituais Familiares aos Sagrados Orixás” de Cris Egídio e Lurdes de Campos Vieira.
  • Atendimento ao próximo, em ações regulares: rompimento com o egoísmo, interessando-nos pelo próximo, auxiliando-o sempre em todas as ocasiões, usando ao máximo nossa capacidade de servir desinteressadamente. Participação em atividades como: distribuição de alimentos, visita aos enfermos, idosos e creches, etc.
  • Frequência ao Templo Umbandista: nas Giras abertas, cursos, desenvolvimento mediúnico e outras atividades oferecidas. Aprenderemos a viver em grupos Humanos que nos permitirão o exercício da humildade. Evitemos as sessões mediúnicas nos lares, pois Templo Umbandista não se improvisa.
  • Reforma Íntima: revisão e reconstrução de nossos atos e hábitos, permutando vícios por virtudes legitimamente religiosas que são as únicas que sobreviverão eternamente. Elevando nosso padrão de conhecimento pelo estudo bem conduzido apuraremos a qualidade de nossa emoção pelo exercício constante das virtudes que aprendemos com os orixás.

O mais importante é lermos novamente esse texto. É bom sabermos que boa parte desse material vem dos ensinamentos de Allan Kardec. Mas que nos é absolutamente semelhante com o que aprendemos em templos sérios com sacerdotes bem intencionados e estudiosos.

Façamos com que nossa Umbanda seja um campo de aprendizado, focando sempre a expansão de conhecimento e nunca sua retenção.

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