Desabafo de um médium de Umbanda

Desabafo de um médium. Isso mesmo.

Escrevo este texto com o intuito de expressar as dificuldades que um médium iniciante passa no decorrer de seu caminho espiritual dentro da nossa Umbanda tão querida.

Assim, nem tudo que descrevo aqui foram dificuldades que eu encontrei.
Pois algumas eu aprendi através da “arte” da observação, vendo irmãos de fé passarem ou permanecerem nelas.

Contudo, antes de relatar alguns fatos, quero explicar o que significa ser médium da Umbanda e o que eu entendo como “fazer parte de uma corrente”.

Igualmente, já adianto que minha intenção não é julgar, muito menos criticar qualquer pessoa.
Mas sim expor meus sentimentos e pensamentos sobre o que tenho vivenciado dentro da nossa religião.

Cresci na religião, desde pequeno.
Sabe quando as criancinhas ficam dentro da corrente, num cantinho?
Pois é, era eu! Uma pestinha, inquieta, mas estava lá.
Aliás, acompanhava o ritmo do tambor, da maraca, os Pontos e até me embalava um pouquinho!
A Umbanda faz parte da minha essência.
Assim, não sei viver longe dessa religião tão linda, que me ensinou e ainda me ensina tanto sobre a vida, não só física, mas espiritual também.

Afinal, não tem sentimento melhor do que saber que naquele dia vai ter sessão.
Começa um ritual, de respiração, preparo, limpeza, organização, higiene, tudo! Que coisa boa!
Enfim, isso tudo porque eu sei que, chegando lá, vou encontrar meus irmãos, amigos, conhecidos e até pessoas que eu nunca imaginei ver na vida.

A fim de fazer o quê? O Bem, a Caridade!

Da mesma forma, me doar, não só na matéria.
Mas, principalmente, de coração e espírito para poder ajudar quem vai em busca de auxílio, uma palavra de conforto, uma energia que arrepia ou até mesmo um sorriso.

Com efeito, tem coisa melhor que isso? Não!
Essa junção de pessoas, médiuns, todas estão ali com um mesmo propósito: ajudar.
E isso, para mim, é uma corrente.
O próprio nome já diz tudo: corrente, mantida por elos (os médiuns) que transmitem essa energia para quem precisa.
Ao passo que, no meu humilde ponto de vista é isso que significa pra mim.

A fase de início de um médium talvez seja a mais difícil no seu caminho dentro da espiritualidade.
Poranto, tudo é novidade, o médium tende a ficar ansioso, com medo e receio.
Da mesma forma, passa um turbilhão de coisas na cabeça de um médium iniciante e ele ainda precisa manter a concentração, saber a hora certa de se entregar e manter o laço espiritual criado firme e forte.

Nossa! Quanta coisa, né?

Assim, se todos soubessem como é difícil passar por esse momento, não fariam cara feia para o médium depois que ocorre a desincorporação.
Igualmente não olhariam torto para ele.

É um momento de descoberta, novidades, onde, aos poucos, ele vai se doando cada vez mais, deixando o Orixá tomar conta da matéria e mostrar sua personalidade, jeito de agir, caminhar, tom de voz, etc.

Às vezes, um médium iniciante tem de lidar com tantas coisas em sua cabeça ao mesmo tempo, que é preciso ter uma maneira mais delicada, sutil ao dar um conselho, até mesmo repreender alguma atitude do médium ou da própria entidade.

Bem como é preciso ter paciência com médiuns novos.
Assim também, não importa se você tem que ter uma conversa, duas ou quantas vezes forem necessárias.
Se o erro não acontece por “maldade” do médium, é preciso ter paciência por parte dos irmãos e dirigentes da Casa.

De fato, muitas são as razões que fazem um médium iniciante deixar o seu caminho espiritual de lado:

– Medo de estar se passando pela entidade;
– Confusão em função da incorporação ser praticamente consciente;
– Represálias, pressões e até mesmo inveja.

Sim. Inveja! E de onde ela vem?

Dos próprios elos dessa corrente mediúnica.

Ao passo que um médium vai se ‘firmando’ com determinada entidade, essa vai agindo de acordo com seu modo específico de ‘trabalhar’.

De fato, algumas entidades são mais quietas, reservadas, outras são mais agitadas, se movimentam mais, estalam dedos, puxam Pontos junto ao tamboreiro, puxam rezas e orações, dão conselhos.

De outro modo, outras já não falam tanto, ficam no seu espaço.
Algumas até “entram mudas e saem caladas”.

Mas isso é particular, cada entidade tem o seu modo de chegar, trabalhar e retornar para o seu campo espiritual de trabalho.

Infelizmente alguns médiuns não entendem que o modo particular de trabalho de seu Guia é o que o torna tão especial e bonito, e acabam por desejar, inconscientemente, que seu Orixá fosse como o do seu irmão.

Assim, como se já não bastasse a inveja, presente em algumas correntes, ainda tem espaço para desafetos entre companheiros de trabalho, arrogância, fofocas e picuinhas.

Tá, mas e a corrente?
Não é constituída através de elos de ligação?
Onde devem ser transmitidas boas energias e bons sentimentos?
Como pode ter espaço pra esse tipo de sentimentos?

Pois é.
Infelizmente, eu não sei responder a esssa perguntas.
Já pensou passar por tudo isso sem estremecer? É praticamente impossível.

Assim, aos irmãos de fé que lerem esse desabafo, sejam eles iniciantes ou já desenvolvidos há um bom tempo, peço que pensem e repensem antes de tomar qualquer atitude equivocada.

Igualmente, peço que reflitam o seu propósito dentro dessa religião tão linda, que é a nossa amada Umbanda.

De fato, reflitam a maneira que estão tratando o seu irmão de trabalho espiritual.

Contudo, por último, vou encerrar dizendo que a Umbanda é muito mais do que se pode ver e sentir.

A Umbanda faz parte de nós.

Aliás, precisamos trazer conosco um pouco do que cada uma das Sete Linhas e do que os ‘Pais e Mães’ nos oferecem.

Portanto, temos que ter a humildade de um Preto Velho, a inocência de uma Criança, o amor de uma Mãe e a responsabilidade de um Pai, a liberdade de um Cigano e até a malandragem de um Exu.

Este foi apenas um desabafo. E o seu? É parecido?

Saravá irmãos de Fé!

Texto-desabafo enviado por Gabriel Huff Marques

Foto: Noah Buscher/Unsplash

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